Desse cenário, emergem oportunidades de crescimento tão grandiosas quanto seus desafios jurídicos. Diante disso, o Direito é acionado e a indústria de games passa a criar uma face própria, com demandas específicas relacionadas a seu desenvolvimento.  Na esfera trabalhista, por exemplo, discute-se a existência ou não de vínculo empregatício entre clubes ou gestores de times e atletas; na esfera desportiva, o enquadramento de e-sports como uma prática esportiva sujeita à regulação desportiva nos termos da Lei Pelé, o que conferiria maior proteção jurídica a atletas, equipes e profissionais envolvidos; na esfera cível, os limites de exploração dos direitos de imagem e de arena de atletas, bem como a negociação de contratos de patrocínio de grandes eventos; a propriedade intelectual, por sua vez, pode ser avaliada sob o contexto da comercialização de jogos eletrônicos, propriedade de software e demais questões relacionadas à tecnologia da informação; por fim, na esfera consumerista, há de se atentar ao aumento considerável de demanda por jogos eletrônicos e frustrações na prestação de serviços e entrega dos produtos. Nesse sentido, estabelecer as bases e os fundamentos dessa indústria é um dos primeiros passos para a imersão em seu contexto – e, consequentemente, para entender seus aspectos jurídicos a fim de pensar nas melhores soluções.  É possível afirmar que o ambiente dos games, sob a ótica do Direito, pode ser entendido em três grandes grupos: (i) jogos em geral; (ii) jogos de sorte (ou de azar); e (iii) e-sports. Cada um deles tem, portanto, questões jurídicas específicas, algumas vezes completamente diferentes entre si. De maneira geral, jogos podem ser entendidos como a modalidade amadora e recreativa dos games. Com consoles ou portáteis, software baseado ou não em nuvem, presentes em nossos bolsos todos os dias com os jogos mobile, jogos recreativos têm suas questões jurídicas mapeadas há algum tempo. Apenas para exemplificar, pode-se citar o desenvolvimento de um jogo de videogame do início ao fim: ao longo dessa jornada, discutem-se os direitos de criadores pela obra (ilustradores, designers, músicos), requisitos perante órgãos governamentais (INPI e ECAD, por exemplo), formas de captação de recurso para pequenos e médios projetos, organização e definição da estrutura societária do negócio, produção e proteção de derivados de personagens dos jogos para o mundo real (por exemplo, bonecos), entre outras questões. Inclusive, não são mais raras ações judiciais que envolvem temas relacionados a jogos, como por exemplo conflitos relacionados a funcionalidades, controle parental ou até mesmo direitos de imagem de pessoas reais que são reproduzidas virtualmente em jogos eletrônicos. Recentemente também, observou-se uma discussão sobre a utilização de bots (robôs) para compra de consoles recém-lançados, para que pudessem ser revendidos em mercados paralelos a preços mais onerosos. Contudo, há muito mais a discutir. Começando por e-sports, estamos diante de uma nova modalidade de jogos atrelados à competição e à profissionalização de atletas. É, literalmente, a junção da indústria dos jogos com as indústrias do esporte e do entretenimento. Dessa combinação aparecem transações de valores bilionários (patrocínios, direitos de imagem, transmissão, etc.) e até novas profissões, como apresentadores de eventos de e-sports, atletas, treinadores desses atletas e até assessoria de imprensa especializada. A multidisciplinaridade dos desafios exige um amplo conhecimento jurídico para as diversas situações narradas: seja no direito trabalhista, cível ou de propriedade intelectual, entre outros. Não por acaso, atletas de e-sports figuram cada vez mais em pleitos relacionados à profissionalização do setor, demandando reconhecimentos de vínculos ou remuneração adequada pela exposição que proporcionam.  Por fim, ainda temos os jogos de sorte, ou azar, que possuem demandas ou discussões próprias, diferentes das demais. Nesse tema, o Supremo Tribunal Federal iniciou em abril deste ano o julgamento de um Recurso Extraordinário, que discute se foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 a tipificação da exploração, estabelecimento ou participação em jogos de azar como contravenção penal. O tema, que teve repercussão geral da questão constitucional reconhecida, pode colocar fim a dois regimes jurídicos distintos atualmente vigentes no país: o de proibição ampla à exploração econômica de jogos de azar, em vigor por força da Lei de Contravenções Penais (da década de 1940, anote-se), e atividades econômicas cujas apostas são legalizadas por normas específicas, como é o caso da recente Lei nº 13.756/2018, que trata das chamadas “apostas esportivas”. É notório, assim, que o mercado de games é gigantesco no Brasil, e no mundo, e ainda está em franco crescimento. Entender os desafios jurídicos e se preparar para enfrentá-los é parte importante do desenvolvimento de qualquer indústria, e por isso é preciso entender como o Direito de fato se relaciona com essas demandas específicas. Temos, então, a tarefa de destravar este potencial de crescimento e mantê-lo em alta, também considerando suas questões jurídicas. Esta matéria foi escrita por Carla do Couto Hellu Battilana, Claudio Coelho de Souza Timm e Patrícia Helena Marta Martins, sócios na área de Gaming & E-sports de TozziniFreire Advogados. Carla também escreveu sobre tudo que você precisa saber sobre a LGPD.

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